Os homens, durante 48 anos e pico, em Portugal, eram os únicos animais amordaçados. Não podiam cantar livremente. Ao contrário dos pássaros, que são encerrados em gaiolas para «cantarem a Primavera pelas grades», aos portugueses era a mortalha de pedra de Caxias e Peniche porque haviam cantado ou poderiam cantar as realidades do país, cruciantes realidades que atemorizavam os algozes do povo, os próprios carrascos das liberdades fundamentais.
Viale Moutinho, Memória do Canto Livre em Portugal.
Antes do 25 de Abril as cantigas versavam temas como o amor, humor, repressão, exortação, paisagem humana, liberdade, guerra colonial, emigração, exílio, esperança, criança, mulher, peso da história, o trabalho, a fome, a habitação, a saudade, ... Se algumas delas foram ultrapassadas, a maioria continua actual!
Necessito da presença dos que me escutam para adquirir a convicção de que cantar tem algum préstimo e serve para alguma coisa.
José Afonso
José Afonso
Era De Noite E Levaram
Era de noite e levaram
quem nesta cama dormia
sua boca amordaçaram
com panos de seda fria
era de noite e roubaram
o que nesta casa havia
só corvos negros ficaram
dentro da casa vazia
rosa branca rosa fria
na boca da madrugada
hei-de plantar-te um dia
sobre o meu peito queimada
na madrugada
Luís Andrade e José Afonso
Trova Do vento Que Passa
Pergunto ao vento que passa
Notícias do meu país
E o vento cala a desgraça
O vento nada me diz
Mas há sempre uma candeia
Dentro da própria desgraça
Há sempre alguém que semeia
Canções ao vento que passa.
Mesmo na noite mais triste
Em tempo de servidão
Há sempre alguém que resiste
Há sempre alguém que diz não.
Manuel Alegre e António Portugal
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